Sem saneamento básico, mortalidade infantil cresce em Pimenta Bueno

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Córregos da cidade são valetas a céu aberto, que espalham mau-cheiro e disseminam doenças contagiosas para a população, que convive com um dos maiores índices de mortalidade infantil do país

A falta de uma rede de esgoto sanitário e de uma lagoa de tratamento, em Pimenta Bueno vem afetando diretamente a saúde da população, em especial do público infantil, que é o mais suscetível a doenças. O Censo do IBGE 2022 mostra que o contágio por doenças disseminadas pela poluição na água e pela ausência de investimentos no setor elevou brutalmente o número de internações hospitalares de crianças, com quadros de diarreia e outros sintomas relacionados a doenças tropicais que, se não forem tratadas de imediato, podem levar a óbito.

Os números do IBGE confirmam os altos índices de mortalidade infantil relacionados à falta de saneamento básico. Segundo o IBGE, a taxa de mortalidade infantil média em Pimenta Bueno é de 18,74 por 1.000 nascidos vivos. É o triplo do registrado, por exemplo, na vizinha cidade de Cacoal, que tem média de seis óbitos por 1.000 nascidos vivos e possui o maior índice de saneamento do estado.

Os casos de internação infantil ocasionados a quadros de diarreia entre as crianças em Pimenta Bueno tomaram dimensões preocupantes de acordo com a pesquisa: foram 647 internações para cada grupo de 100.000 habitantes. Neste aspecto, Pimenta Bueno tem a terceira maior média de internações por diarreias em todo o estado, resultado direto da falta de tratamento sanitário adequado no município.

No panorama nacional, a situação também é alarmante: o município tem uma das 100 maiores médias desse tipo de internação infantil, ainda segundo o IBGE, quando comparado aos 5.570 municípios brasileiros. O município de Pimenta Bueno ocupa a 95ª posição nacional em internações infantis relacionadas a quadros de diarreia, que seriam facilmente evitáveis com a implantação de políticas adequadas de saneamento básico no município.

A lista de doenças relacionadas à falta de uma estrutura de saneamento básico adequada é bastante extensa, em especial na região amazônica, e inclui esquistossomose, malária, hepatite, cólera, febre tifoide, parasitoses, leptospirose, leishmaniose, toxoplasmose e disenteria bacteriana, além do agravamento de epidemias como a dengue, zika e chikungunya. Essas doenças ocasionam sintomas como diarreia, dores abdominais, enjôos e cansaço, normalmente relacionados à desidratação infantil e que requerem a imediata internação da criança, uma vez que se a desidratação for prolongada, poderá levar à morte.

ÁGUA CONTAMINADA

Análises laboratoriais realizadas em 155 amostras da água consumida pela população de Pimenta Bueno tiveram como resultado a presença de coliformes fecais em 27 dessas amostras, sendo que em duas delas foi constatada a presença da bactéria Escherichia coli. A presença de coliformes totais e dessa bactéria na água é uma evidência de que ela está poluída com fezes humanas ou de outros animais de sangue quente. Esses são os indicadores microbiológicos mais utilizados para associar riscos à saúde frente a uma possível contaminação da água.

A pesquisa, realizada em 2019 pelo SISAGUA (Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água), do Ministério da Saúde, também identificou 74 amostras fora dos padrões de pH da água presente no sistema de distribuição, que deve se situar normalmente entre 6,0 e 9,5. Isso representa praticamente metade de todas as amostras pesquisadas. O sistema de abastecimento de água de Pimenta Bueno cobre a Sede Municipal, o distrito de Itaporanga e o distrito de Urucumacuã, sendo administrado e operacionalizado pela prestadora de serviços Águas de Pimenta Bueno Saneamento SPE LTDA.

Os dados constam no relatório do projeto Saber Viver, realizado pelo Instituto Federal de Rondônia (IFRO) e Fundação Nacional da Saúde (FUNASA), que identificou 10.357 domicílios na área urbana e 1.399 na área rural de Pimenta Bueno, além de 190 domicílios no distrito de Urucumacuã e 295 no distrito de Itaporanga. De um total de 12.241 domicílios, 10.768 utilizam fossas rudimentares. Em 442 domicílios, a população lança seus dejetos diretamente nos rios, igarapés, valas e sarjetas a céu aberto.

Apenas 660 domicílios possuem ligações ativas por redes de esgoto, que foram realizadas de forma privada e são exclusivas dos conjuntos habitacionais BNH 1 e 2, enquanto 371 domicílios utilizam a fossa séptica, cuja manutenção é feita por caminhões “limpa-fossa”. Isso representa pouco mais de 1.000 domicílios, ou seja, menos de 10% de todo o município.

A ausência de um sistema de esgotamento sanitário no município obriga a maioria dos moradores a adotarem soluções “caseiras”, ficando expostos a potenciais riscos de contaminação por esgotos, principalmente no solo e em águas subterrâneas. Ligações clandestinas de esgoto realizadas a céu aberto em valas e escavações destinadas à drenagem da água da chuva ajudam a agravar ainda mais a situação.

INUNDAÇÕES

Outro problema bastante conhecido da população são as enchentes provocadas pelas cheias dos rios Pimenta Bueno e Barão de Melgaço, que trazem imensos transtornos a centenas de moradores situados nas proximidades desses rios. Em muitos locais, é possível observar bocas de lobo danificadas e com entupimento, ausência de gradeamento e tampa, meios-fios e sarjetas mal dimensionados, além das ligações clandestinas de esgoto nas galerias pluviais e obras inacabadas de microdrenagem, que resultam da falta de manutenção da infraestrutura existente.

A falta de saneamento básico em Pimenta Bueno é uma questão de saúde pública, mas também representa um dos maiores entraves para o desenvolvimento do município. A construção de edifícios fica restrita em qualquer cidade que não possua uma estrutura adequada de saneamento público. Isso traz impactos não somente nas moradias urbanas, mas também na expansão de empresas comerciais e de novas indústrias. Como não existe planejamento voltado para o saneamento básico, os rios se transformam em autênticas valetas a céu aberto.

Diversos bairros de Pimenta Bueno possuem moradores que residem às margens de vários rios e igarapés que cortam a cidade. A qualidade de vida dessa população está muito abaixo do que seria aceitável por causa da falta de investimentos do poder público em saneamento básico. Problemas relacionados ao mau cheiro, sobretudo na época da seca, são comuns e se estendem por anos a fio, sem nenhuma perspectiva de solução. A gestão precária da água também pode causar doenças relacionadas à higiene pessoal, como micoses e conjuntivites.

O município de Pimenta Bueno faz parte da lista de cidades que possuem os menores índices de tratamento adequado do seu esgoto sanitário em Rondônia. A falta de investimentos públicos impacta diretamente sobre a saúde da população e o meio ambiente, já que não existe um sistema de captação de água para tratamento de esgoto.

MARCO LEGAL

A meta do Marco Legal do Saneamento Básico no Brasil determina que todas as cidades deverão contar obrigatoriamente com a oferta de todos os serviços relacionados ao saneamento básico até 31 de dezembro de 2033, assegurando o atendimento a 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgoto.

A Lei Federal n.º 11.445/2007, conhecida como “Lei do Saneamento Básico”, determina que toda cidade brasileira obrigatoriamente precisa ter seu Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB). O plano estabelece o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais relativo aos processos de abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos, drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.

Mas, além de abranger estas quatro áreas, o PMSB é instrumento estratégico de planejamento e de gestão participativa. Estabelece as diretrizes para o saneamento básico e fixa as metas de cobertura e atendimento dos serviços de água; coleta e tratamento do esgoto doméstico, limpeza urbana, coleta e destinação adequada do lixo urbano e drenagem e destino adequado das águas de chuva.

A qualidade do saneamento básico também depende de outros serviços essenciais e envolvem a gestão adequada de resíduos sólidos, por meio de ações como coleta seletiva, reciclagem, compostagem, incineração e disposição final em aterros sanitários. Um longo caminho a ser percorrido, com muito trabalho a ser feito, e que vai necessitar sobretudo da coragem e consciência política dos próximos governantes municipais.

Por Sandro André | Jornalista

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